08/01 – Caleta Tortel-Villa O’Higgins
Na
saída de Caleta Tortel, os perros nos acompanham novamente. Agora temos todo o
cuidado do mundo. Pela frente, o final da Carretera, na mítica Villa O`Higgins.
Lili, versão Carretera Austral. |
O
caminho é todo de rípio novamente e a atração do dia é o rio Baker. Os nomes em
inglês são comuns e descobrimos que, sim, houve colonização da rainha por aqui
também, na virada do XIX para o XX.
Puerto Yungay, um braço do pacífico. |
Chegamos
em meia hora, aproximadamente, a Puerto Yungay, onde há um pequeno ferry-boat,
gratuito, que atravessa um braço do pacífico. Cerca de três horas depois (uma de ferry, duas de estrada) estamos em Villa O’Higgins. Todos achamos estranhos que o ferry fosse gratuito
e a explicação viria no final do dia. No ferry, o capitão se engraçou com as
ticas, em especial a Fran – é o tio da Sukita da viagem. E, ali na balsa, também conhecemos Daniel, um sociólogo da UFRR – Universidade Federal de Roraima – que
dá aula para índios em Boa Vista.
Tio da Sukita. |
Modelito burca, depois do tio da Sukita. |
Casinha típica de Villa O`Higgins. Ache o gato. E a senhora que nos observa. |
Escada para o mirador da cidade. |
Villa
O’Higgins é o final (ou quase o final) da Carretera. A estrada só chegou na
cidade no final dos anos 90. E o pequeno povoado é dos anos 60. Há bandeiras
chilenas em praticamente todas as casas – o que também é estranho: no quesito
patriotismo, é mais comum ver um cenário assim na Argentina, mas não tanto no
Chile. Detalhe: O’Higgins é o herói da independência chilena – o Dom Pedro II
deles.
Abastecemos
no Copec da cidade e buscamos informações sobre a viagem até o glaciar
O’Higgins que fica aqui perto. E aí descobrimos que partidas só irão sair daqui
dois dias – desde que existam condições climáticas para o barco zarpar. Com
esta informação, planejamos tudo de volta, as fotos do glaciar são
impressionantes e decidimos que vale a pena ficar por aqui.
Vista de Villa O`Higgins. |
Mais
uma vez, estamos em cabañas – desta vez na do El Mosko, excelente. E a dona,
Fili, como sempre aconteceu antes, nos atende super bem. E é com ela que começamos
a descobrir o segredo de Villa O’Higgins.
Pessoal no final da trilha do mirador. |
A
colonização foi uma decisão do Estado – marcar território, para demarcar a
fronteira. Ainda hoje, há zonas cinzentas do que é Argentina e do que é Chile
no extremos sul do continente. Nos mapas chilenos, há quadrados com asteriscos,
que indicam que ali ainda não se sabe bem qual é a fronteira (o que não
acontece com os mapas argentinos) e povoar esta região do país se tornou uma
questão de soberania nacional.
Ok,
os colonizadores vieram, mas para fazer o quê? Há comércio, uma indústria de
turismo ainda insipiente (e provavelmente continuará insipiente – o inverno
nesta região da patagônia é terrível e não mais do que dois meses são a alta
temporada), os dois postos de gasolina. E o resto é o Estado. A maior parte da
população da cidade são funcionários públicos – trabalham para a prefeitura.
Recebem um soldo (engraçado a artesã da cidade que nos deu esta informação usar
a palavra soldo – um vocabulário militar) e ficam aqui. Para fazer o quê? A
artesã explica que para quase nada – abrem caminhos que vão do nada a lugar
nenhum. Você anda pelo povoado e, fora os comerciantes, ninguém está
trabalhando – não há ninguém nas ruas. Em outras palavras, o governo paga cerca
de 500 pessoas para que elas não façam porra nenhuma. Ou melhor: elas fazem,
elas ficam aqui. Villa O’Higgins é
linda – está num vale circundado por montanhas nevadas, algo que fica
espetacular quando você sobe em um dos miradores. Mas é muito isolada – morar
aqui não é moleza. No mercado, as frutas e verduras vêm uma vez por semana – e
são disputadas como ouro. Não há muito o que se fazer do ponto de vista
econômico. Por tudo isto, é um lugar mágico, mágico como uma Macondo patagônica, um tom meio onírico de vento, neve e montanhas.
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